Por Marco Gorini, originalmente publicado pela AUPA

Na coluna de setembro, comentamos que para elevar as chances de sucesso contra o Vale da Morte, temida fase na trajetória de desenvolvimento de uma startup, a primeira atitude necessária para o empreendedor é reconhecer, compreender e respeitar profundamente três palavras que sintetizam a sua essência: escassez, volatilidade, nebulosidade.

O que podemos fazer para lidar com esses desafios? Não há receita de bolo, mas alguns ingredientes podem ajudar bastante nesta jornada. Trataremos do primeiro, a escassez, nesta coluna.

Estamos nos referindo à competência de compreender quais são as perguntas certas a serem feitas (e respondidas) sobre o que de fato importa para o êxito em cada movimento e etapa. O objetivo é desenvolver um senso de priorização, capacidade de foco e criação de indicadores de evolução que iluminem a jornada. Ao fazer isso, o empreendedor pode, além de acelerar o aprendizado necessário para aperfeiçoar o desenvolvimento do seu modelo de negócios, evitar dar um passo equivocado que o fará sacrificar tempo, caixa e time, recursos de elevada escassez.

Acredita-se que recursos financeiros são a chave de sucesso para esta etapa e que garanti-los é sinônimo de sucesso. E é claro que são fundamentais! Entretanto, o mais relevante é encontrar o cliente que pagará pelo produto ou serviço que desejamos vender. A primeira causa mortis de uma startup é não haver encontrado o cliente pagante que imaginamos existir na ideação do Minimum Viable Product (MVP) – que significa Produto Mínimo Viável. E sem ele, não há recurso financeiro suficiente para fazer o negócio sobreviver no tempo.

A nossa experiência empírica mostra que a maioria dos empreendedores tem alta dificuldade para estruturar esse movimento. Muitas vezes, inclusive, procrastinando a ida a mercado para refinar o aprendizado no funil de vendas. Em vez disso, focam a ação em aperfeiçoar produto, incorporar tecnologias, ampliar times, desenvolver processos ou até mesmo abrir novas unidades. E tudo isso sem haver respondido as perguntas centrais da descoberta do cliente: alguém paga pelo que estamos querendo vender? Se sim, o que pagam será suficiente para entregarmos o produto, mantermos a empresa e gerarmos resultado positivo? Se sim, à medida que expandirmos as vendas, será possível obtermos ganhos de escala?

No caso de startups de impacto social, um desafio a mais é compreender se o impacto esperado de fato demonstra evidências de que existe. Por fim, quais são as evidências que temos das respostas, para estarmos confortáveis a ponto de dar o próximo passo com menor risco?

Focarmos em elevar a nossa competência empreendedora para responder a essas perguntas é a prioridade nesta etapa da jornada.

Aprender a criar testes de mercado, interagindo com os potenciais clientes e colhendo os feedbacks de forma estruturada, pode nos ajudar muito. Em outras palavras, precisamos aprender a fazer algumas perguntas claras tais como: O que desejamos testar? Quais das premissas do nosso MVP desejamos colocar a prova? Em quanto tempo faremos o teste no “campo” (online e/ou offline)? Com quantos clientes potenciais? Quais indicadores serão úteis (taxa de conversão, ciclo de venda, ticket médio, custo de aquisição do cliente – CAC…)? E quais resultados desses indicadores nos dirão que estamos certos na premissa, a ponto de assumirmos que deixou de ser premissa e virou evidência ou fato comprovado do modelo?

Com o resultado dos testes em mãos, podemos gerar muito aprendizado para aperfeiçoarmos o modelo e decidirmos se já existe maturidade para o próximo passo. Obviamente, a “honestidade científica” aqui é essencial. Nós, empreendedores, precisamos ser apaixonados pelo que buscamos e fazemos, mas jamais apegados a ponto de não querer enxergar a realidade.

Por fim, os únicos indicadores financeiros relevantes neste estágio são o cashburn – quanto você está consumindo de caixa por mês enquanto está buscando o cliente – e o runway, que é o tempo que você tem de vida devido ao caixa que possui. Garantir recursos para um runway suficiente em termos temporais para superar o estágio da descoberta do cliente pagante é o que importa em termos de recursos financeiros.